sábado, 16 de abril de 2011

SALVAR A GRALHA

Levado pela esposa que adora ônibus, desço na Rui Barbosa, vou chegando perto da carrocinha de pipoca do amigo paranista e ele já vai largando o jornal, os olhos febris, esperando o meu abraço e o meu apoio no momento difícil do time do seu coração.
– E aí meu irmão, o Paraná vai? – pergunto com a óbvia intenção de saber sua opinião sobre a segunda divisão acampada à porta da Vila Capanema.
– Depende do Paraná e do Paraná Vaí. – responde ele, acentuando as palavras, obrigando-me ao raciocínio que não quero fazer. Para quem nos últimos anos tem convivido com o fantasma do rebaixamento, sei que as contas a fazer são múltiplas, as possibilidades diversas, só a matemática pode jogar um time no abismo, ela própria a maior geradora de esperanças. – Eu já esqueci o Rio Branco –, continua cheio de fé, – acho que o Paranavaí vai para o buraco no nosso lugar –. As mãos aflitas parecem rasgar um contrato já quase assinado e os olhos clamam pela minha aprovação ao pensamento lapidado com esmero, imagino por quanto tempo.
– Você sabe que o Paranavaí joga com o Atlético no maior dos bagaços, não sabe? – indago passando o braço por sobre o ombro do suplicante, tentando confortá-lo.
 – Você acha que o Atlético vai entregar o jogo na Arena? – pergunta o angustiado, a voz amiudada, as mãos na cabeça, esfregando os ralos cabelos em pé, como a assistir o Bom Dia Desgraça, o jornal que tem a missão de fazer o povo brasileiro sair para o trabalho cheio de confiança.
– Não se trata de entregar – aperto o paranista num abraço sincero, – mas o Atlético está mais para ventilador chinês do que para Furacão, metade no estaleiro, metade suspensa por amarelos, e as contratações você sabe bem quem faz. Quem faz? – pergunto enfático.
– Eu sei muito bem – sussurra inconsolável, a cabeça baixa, os ombros caídos, quase que a responsabilizar-se pela nossa própria desgraça, os olhos parecendo ver o carrasco com seu imenso machado sobre o frágil pescoço da gralha agonizante.
– É meu irmão, vocês estão nos pés do Gabriel Pimba, do Gabriel, este, aliás, você conhece bem, já jogou no Paraná.
– Meu Deus do céu! – Os olhos pregados na fachada da igreja do Bom Jesus parecem lacrimejar, o corpo cansado fraqueja e eu o amparo consolador.
– Calma meu irmão, Gabriel é nome de anjo, vai dar tudo certo. Como você disse, depende do Paraná, do teu time fazer a parte dele, vencer as partidas que faltam. Deixa o Paranavaí para o rubro-negro da Baixada. A vitória salvadora será difícil, mas virá. Vou lá torcer pelo Furacão e pelo teu Paraná. – Ele me olha com uma expressão de dúvida, procurando uma ironia que não existe nas minhas palavras.
O olhar da esposa cansada de esperar me faz abraçar o amigo velho, desejar boa sorte e partir, carregando um pacotinho da doce, um mimo para amenizar os reclamos da mulher amada.
Sigo com destino a uma lojinha, duas, quantas forem necessárias. O meu porteiro coxa reclamou que o Atlético perderia o jogo para dar o campeonato antecipado ao Coritiba e evitar a festa na Arena. O meu prezado amigo paranista clama aos céus pela vitória rubro-negra. Entre esses dois pensamentos, tenho uma certeza clara como a história atleticana e honesta como a vida do pipoqueiro irmão. É jogo para ganhar e salvar a gralha.

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