segunda-feira, 23 de maio de 2011

O BURACO NA DEFESA

– Como é que você fez isso? – pergunta o genro entusiasmado, vendo a sogra pálida, sem fala, os olhos dois pires fixos na agulha imensa. – Foi erro de dosagem? –, insiste com a enfermeira a se afastar com a seringa cavalar na mão, sem uma gota do calmante poderoso – Me ensina! Me ensina! – implora o degenerado.
– Meu senhor, jamais um erro de dosagem –, acode a chefe da enfermagem a menina de branco –, apenas uma falha de posicionamento. A injeção que era para ser dada no braço, por equívoco, foi dada no pescoço. Acontece. A enfermeira é nova, vai melhorar. – O genro sorri deliciado com a descoberta.
Segundo o professor, o Atlético perdeu por falhas de posicionamento, nunca pela overdose de volantes que tirou da manga, como por mágica. E eu pensei que o trabalho da semana fosse para acertar posicionamentos. Sou uma mula.
A esperteza de Dorival Jr merece elogios. Foi brilhante a entrada de Toró, um primeiro volante proibido de atravessar a linha de meio campo, no centro do ataque para receber lançamento e fazer gol. Quase fez dois. Sun Tzu ficaria orgulhoso. Surpresa muito bem urdida e implementada.
Já não se pode dizer o mesmo dos gols de cabeça do veterano e baixinho magnata, jogador para receber marcação aproximada em tempo integral. Nos dois últimos jogos levamos três de cabeça. A defesa só piora e procuramos atacantes.
Dorival Jr conseguiu em trinta minutos fazer dois a zero em time com oito jogadores de defesa, mais o goleiro. Algo para ir para o livro dos recordes, fazer concorrência com o Atlético de 2010 que, contra o Palmeiras em São Paulo, com quatro zagueiros, em dois minutos já perdia de um a zero. Carpegiani e Adilson brigam pelo troféu Defesa Desastrada.
O problema dessas escalações ruinosas é a total falta de equilíbrio. Para você virar o resultado tem que mexer no mínimo em três jogadores, colocar atacantes às pressas, arriscar-se a tomar goleada inesquecível, colocar a público a armação incompetente. Resumo do parágrafo: após levar os gols, melhor seria voltar para o recôndito do lar.
O que faz o esperto com a casa em pandarecos. Persiste na ideia inicial, repete a lorota, acreditando na estupidez alheia. Findo o primeiro tempo coloca um atacante, mais adiante substitui o único meia, ao final, mete outro defensor campo adentro.
É a teoria da manutenção da proposta. O momento da entrevista está chegando, é necessário os jornalistas reconhecerem que, pelo menos, o professor errou com convicção. Não houvesse as falhas de posicionamento, teríamos ganho. De uma forma sutil, culpa os jogadores.
Tomar o chamado nó tático não é privilégio do seu Adilson. Ficar sem condições de reagir com uma hora de jogo pela frente é erro grave a ser admitido, pregado em editais pelos quatro cantos da cidade.
Se a historieta do início fosse real, a enfermeira de salário mínimo seria processada, perderia a carteira de trabalho, estaria na rua da amargura. A imprensa correria às pressas para a reportagem imperdível. A manchete de primeira página estava pronta: EMUDECEU A SOGRA.
No mundo à parte do futebol, as desculpas esfarrapadas encerram o assunto, nem uma multinha sobre os milhares de reais recebidos será aplicada, basta um instante de paciência, suportar os dez minutos de entrevista.
A torcida não pode deixar passar em branco. Tem que exigir. O salário do treinador deve custar o equivalente ao valor pago por umas mil e quinhentas cadeiras mês. Mais a tropa que assessora, põe aí umas duas mil cadeiras. Sai do seu bolso torcedor. Como sai do seu bolso o salário de prefeitos, vereadores, deputados, senadores e caterva. Temos que exigir perfeição do trabalho dessa gente. O cratera na avenida tem mesmo valor que o buraco na defesa.

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