domingo, 17 de julho de 2011

JOGARAM PÓ NO ATLÉTICO

Minha última anotação sobre o jogo de ontem diz: gol do Vasco no último segundo do primeiro tempo. É muito azar.
Vacilo ente maltratar o amigo revivendo o drama, ou contar velha história de mandingas. O amigo já sofreu demais? Ficamos com a história de mandingas? Vamos lá.
Em 1975, servia eu no 10º Grupo de Artilharia de Campanha, o 10º GAC, em Fortaleza. Responsável pela topografia do grupo, vivia entre teodolitos, tábuas de logaritmos, senos, cosenos e tangentes, o velho Pitágoras um amigo fiel. O prezado não sabe a calculeira que envolve um simples tiro de canhão.
No meio do ano de instrução surgiu um campeonato de futebol entre as unidades do Comando Militar do Nordeste. Os quartéis disputariam campeonatos nas suas Regiões Militares e os campeões seguiriam para Salvador para o torneio final. O tenente treinador do 10º GAC, o metido que vos fala.
Vencemos a fase regional contra as unidades do Maranhão e Piauí, no meu imaginário uma seletiva para a Copa do Mundo, e pegamos o ônibus para a terra de todos os santos e santas.
As partidas eram à noite na Fonte Nova. Uma organização exemplar. Nosso primeiro jogo foi contra o representante da Bahia, o dono da casa. Surpresa absoluta, os meus cabeças chatas venceram. Ressalte-se, os meus soldados jogavam muita bola.
Fomos para o segundo jogo contra a Polícia do Exército de Pernambuco. Aconteceu de tudo. Bolas na trave, gols perdidos, pênalti perdido, nosso principal atacante seriamente contundido. Saímos de campo satisfeitos com o zero a zero, conscientes do merecimento da vitória.
No dia seguinte, fui à cantina do Batalhão Pirajá, que nos hospedava, comprar um chocolate, algo que trouxesse a força que o pão cacetinho com grossa camada de manteiga e o caneco de café com leite não conseguira. Ali, no meio da soldadesca ruidosa, ouvi: Tenente! Tenente! Jogaram pó no seu time.
Perplexo, fiquei sabendo do feitiço lançado contra o meu esquadrão de aço. O vidente, se assim posso chamar a praça conhecedora do assunto, além de alertar, dava a solução. Defumação do vestiário e, antes de entrar em campo para o último jogo, toda a delegação deveria tomar banho.
Não tive dúvidas. Cacei meu auxiliar, o sargento Calixto, e fomos de ônibus ao centro da cidade, parando em terminal onde, entre acarajés e cocadas, encontramos os defumadores indicados. Compramos uma boa quantidade e já iniciamos o fumacê no alojamento do quartel. Chegamos mais cedo na Fonte Nova, repetimos o processo fumarento e tomamos o banho recomendado.
Final da história. A imensa taça de campeão hoje deve adornar a galeria de troféus do Grupo de Artilharia de Selva em Boa Vista – Roraima, em que foi transformado o meu querido 10º GAC, agora pronto a defender o tesouro amazônico.
No caminho para a rodoviária, paramos na Igreja do Senhor do Bonfim e deixamos fotografia do time no local reservado para agradecimentos. Os homens em armas têm fé, agarram-se a todos os santos, é preciso.
O espiritismo virou ciência e eu não tenho mais neurônios para estudá-la. Pitágoras tem culpa. O kardecismo que vivi na infância, legado pela mãe, ficou apenas na crença na reencarnação e na existência de algo mais além deste nosso planeta de provas e expiações. Verdade ou não, só vou saber quando partir para os felizes campos de caça. Se assim não for, guerreiro que fui, devo ter direito a umas quarenta virgens.
Dizem que se mandinga ganhasse jogo, Bahia e Vitória terminaria empatado. Será? Alguém na algaravia de uma cantina de quartel me deixou em dúvida.
O Atlético vive um momento turbulento, as mágoas estão expostas, pensamentos maus povoam mentes inconscientes, ódios profundos se traduzem em cartas e declarações. Isso não é bom. A mãe que me puxou pela mão e me colocou para estudar repetia: mantenha sempre seus pensamentos elevados. Saudades da minha mãe.
Se os incensos que queimei, o banho que tomei, foram os vetores do meu dia de Muricy, não sei. Prefiro acreditar que sim. Mesmo se não acreditasse, caso encontrasse o presidente Malucelli em praça de alimentação de qualquer shopping da cidade, a minha primeira frase seria: Presidente! Presidente! Jogaram pó no Atlético.

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